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  Menos trânsito significa menos desastres? E as vítimas?
  [2020-4-11] 

  Em tempos de Covid-19 temos assistido a um confinamento da maioria das pessoas nas suas residências. Isso tem levado a uma diminuição assinalável do trânsito nas estradas e ruas de Portugal.

Sendo certo que menos tráfego automóvel tem uma influência no número de desastres nas estradas, também é certo que o desastre rodoviário mesmo que, por hipótese, afetasse apenas uma pessoa (e são à ordem das dezenas, todos os dias em Portugal), causando-lhe a morte, algum tipo de incapacidade definitiva, ou mesmo temporária, tem sempre um grande impacto nos padrões de vida da pessoa acidentada e/ou dos que lhe estão mais próximos. Impacto no(s) interveniente(s), na familia (nuclear e extensa), nos amigos, etc.

Não é exagerado dizer que os desastres rodoviários são um dos eventos da vida moderna que pode desestruturar a existência de um indivíduo e da sua família, podendo alterar-lhe de uma forma significativa as suas vivências no âmbito da saúde, do trabalho, das relações, na sua auto-estima, etc.

Porém, não parece ser uma ameaça para todos, ao mesmo tempo, como um surto de doença pandémica, mas os números são arrasadores: morrem, anualmente, cerca de 1.240.000 pessoas em desastres nas estradas no mundo. Sim: Um milhão, duzentas e quarenta mil pessoas / ano. E, muitas, crianças. Sim, crianças, onde o cenário de morte ocorre na tentativa de todos os dias irem à escola!

Ainda assim, reduzir o desastre rodoviário a simples estatísticas agregadas e a números leva-nos sempre a uma visão simplista da realidade, que esquece dores, dramas pessoais e familiares que podem ter impactos muito signicativos, consoante o grau de gravidade do mesmo.

Na situação atual, no mundo desenvolvido, onde existe um encerramento generalizado de uma boa parte da atividade económica, as ruas e estradas encontram-se com muito menos trânsito. Existem, no entanto, fatores de risco acrescidos que podem levar a que os desastres continuem a ocorrer:

1) Um aumento da velocidade média de circulação, acima dos limites legais ou acima daquelas que as características da via pública poderiam aconselhar, nomeadamente, dentro das localidades. Empiricamente, no sítio onde vivo, na Quinta do Conde, tenho assisistido com mais frequência à ocorrência deste fenómeno;

2) Um menor cuidado dos peões a circular, tendo em conta que terão menos precauções no atravessamento de ruas e estradas, mais vazias de trânsito;

3) Um aumento da ansiedade generalizada por parte de todos os utentes da via pública, na forma como vão sair à rua e utilizar o espaço público, tendo em conta as regras de isolamento físico e social a cumprir;

4) A necessidade de, no momento posterior às regras de confinamento, nos voltarmos a habituar a partilhar a via pública com dezenas ou centenas de utentes; por exemplo, o regresso das trotinetas, bicicletas, hoverboards e afins...

Só como exemplo, existiram em Portugal, nas áreas geográficas da responsabilidade de cobertura pela GNR, entre o dia 04/04/2020 (sábado) e, ontem, dia 10/04/2020 (6ªf), 459 desastres, dos quais se lamentam um morto e sete feridos graves.

Efetivamente, os números são pequenos, em comparação com uma situação normal de circulação intensiva, mas não é demais lembrar, como já o fizemos neste texto, que a perca de uma vida humana ou a existência de uma incapacidade é um fardo pesado para todos os envolvidos. É caso para dizer que, neste caso, a contagem de apenas um morto ou um incapacitado é demais!

Diremos, também, que se a circulação e trânsito continuarem neste formato reduzido nos próximos tempos, poderemos assistir a um reduzir dos números, mas fruto do aumento das velocidades de circulação, o desastre, quando ocorrer, terá um potencial de maior gravidade para os seus intervenientes, principalmente os mais vulneráveis como os peões, ciclistas ou motociclistas.

Mantenham-se seguros, por favor.

Hélder Conceição